
Um amigo protestante disse-me recentemente que tinha ouvido uma professora universitária a dizer que a Bíblia está recheada de “linguagem opressiva”. Há quem fale nestes termos, e ensine os outros a fazê-lo também. Há até quem exija que a linguagem bíblica, ou o discurso com base em linguagem bíblica sejam banidos. (Figuras como Abraham Lincoln ou Martin Luther King teriam tido muitos problemas com esta gente, e ficariam com muito pouco por dizer.)
Como responder a isto? Suponho que se poderia começar com um simples: “Não, a Bíblia não está cheia de linguagem opressiva, mas tu estás”. Mas como a velha resposta de “a tua mãe é que é” nunca foi um argumento especialmente convincente, talvez seja necessário ir mais longe.
Permitam-me sugerir que o principal problema com a afirmação desta mulher é de que demonstra uma preocupante falta de noção, em dois sentidos. Em primeiro lugar parece não ter noção de que aquilo que se considera “opressivo” tem muito a ver com os pressupostos que se trazem para o diálogo, especialmente quando se tratam de pressupostos sobre a natureza e a realização humanas.
Se eu digo: “Aquele rapaz dará um bom pai”, isso não é linguagem opressiva, desde que eu considere que ser pai é uma coisa boa. Se eu disser: “Este rapaz tem bom corpinho para trabalhar na minha plantação como escravo”, isso sim é linguagem opressiva.
Se eu disser: “Esta rapariga dará uma boa mãe”, isso não é linguagem opressiva. Se eu disser: “Esta rapariga dará uma boa advogada”, isso também não é linguagem opressiva. Mas se eu disser: “Esta rapariga dará uma boa prostituta”, isso é linguagem opressiva – na minha opinião, dadas as minhas visões sobre a natureza e a realização humanas.
Claro que, se alguém parte do princípio que a maternidade é essencialmente uma coisa “opressiva”, da mesma forma que eu considero a prostituição opressiva, então faria sentido dizer que não se deve elogiar as mulheres por serem “boas mães”, de igual modo que eu acho errado elogiar uma mulher por ser “uma excelente prostituta”. Mas ao não compreender que as acusações de “linguagem opressiva” estão sempre associadas a visões particulares de natureza e realização humanas as pessoas podem cair noutro tipo de “linguagem opressiva” bem mais sinistra.
Isto porque muitas vezes a própria conversa da “linguagem opressiva” é em si mesma opressiva e representa um esforço para calar e dominar os outros, como manifestação de desejo próprio de poder. Passa por dizer, na prática, que todas as formas de discurso para além das minhas são inaceitáveis e devem ser suprimidas.

Acontece uma coisa semelhante quando vemos sinais a dizer “Espaço Seguro” e sentimo-nos imediatamente inseguros, sabendo que o mais provável é que a pessoa naquela sala nos queira sancionar e “cancelar” por usar as palavras erradas, caso a nossa linguagem não cumpra os padrões do discurso universal e totalizante da elite cultural dominante.
Um “discurso totalizante”, para quem não está habituado à linguagem nova, é um discurso de poder usado para dominar e oprimir os outros, ao subsumir ou excluir todos os outros modos de discurso, categorias ou narrativas da realidade.
Assim, por exemplo, eu posso ver uma amiga e dizer “ela é uma mãe maravilhosa”. Mas talvez alguém me ouça e responda que isso é linguagem opressiva. Mas será? Se uma mulher me disser que não quer ser mãe, eu posso responder: “Tudo bem, existem outras vocações”. O meu discurso não é totalizante, porque eu assumo que pode haver outras abordagens à natureza e à realização humanas.
Mas a pessoa que me admoestou não aceita isso. Na prática, o que ela está a dizer é: “Não podes usar linguagem que implique que a maternidade é um bem para a humanidade”.
Mas eu acho mesmo que a maternidade é um bem para a humanidade. Não só uma coisa humana boa, mas um bem para a humanidade. A exigência de que eu não diga isso é voz alta é opressiva, tão opressiva como se eu dissesse ao meu interlocutor: “A maternidade é o único papel apropriado para uma mulher, por isso não se deve referir que as mulheres possam tornar-se advogadas, ou médicas, ou que desempenhem qualquer trabalho fora de casa”.
Eu não nego que possa haver pessoas que dizem coisas desse género, mas na minha experiência são muito poucas. E se eu ouvisse alguém dizer que a maternidade é o único papel que uma mulher pode desempenhar, argumentaria que estão errados e que a sua visão sobre o bem para as mulheres é demasiado limitada, tal como argumentei que estariam errados ao dizer que a maternidade não é um bem para a humanidade.
Fazer afirmações com base na nossa ideia de bem e realização humanas é uma coisa, toda a gente o faz, quer tenham reflectido sobre esses pressupostos ou não. Mas exigir que se proíbam expressões baseadas em noções diferentes de bem e realização humanas é outra coisa totalmente diferente.
Alguém pode dizer: “Eu não acho que a maternidade (ou a paternidade em geral) seja uma coisa boa, e não acho que conduza à realização humana”. Tudo bem, discordamos. Mas eu sou a favor da liberdade de expressão. Mas é outra coisa dizer-me: “Não deves nunca elogiar uma mulher por ser boa mãe. Essa visão do que é bom para uma mulher é inaceitável”. Isso já não é liberdade de expressão, é totalitário.
Na Bíblia encontramos elogios a mulheres por serem, entre outras coisas, cuidadosas, prudentes, astutas, amáveis, generosas, boas e corajosas. Também encontramos elogios pelo bem que fazem. A Bíblia ensina que o adultério e a fornicação são coisas más. As pessoas podem discordar, podem argumentar que a Bíblia está errada na forma como elogia ou culpa pessoas e que tem uma visão errada da natureza e da realização humana.
Mas o que não devem fazer é insistir que a linguagem bíblica, e as suas afirmações sobre o bem para a humanidade devem ser suprimidas porque não vão ao encontro do discurso totalizante da modernidade. Isso é opressivo. Talvez seja tempo de chamar os bois pelos nomes.
Por isso se você disser: “Esta mulher é uma boa mãe”, e alguém lhe disser que está a usar uma linguagem opressiva, deve responder que “não, não é. Isto é algo que podemos discutir, mas eu sei bem o que está a tentar fazer, por isso agradeço-lhe que guarde a sua linguagem opressiva para si”.
Randall Smith é professor de teologia na Universidade de St. Thomas, Houston.
(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na terça-feira, 20 de Agosto de 2024)
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