
No dia 30 de Junho celebrámos a solenidade dos Primeiros Mártires de Roma, um conjunto de cristãos, na maioria desconhecidos, que foram perseguidos e mortos no ano 64, a mando do Imperador Nero. Alguns foram envoltos em peles de animais e despedaçados por cães em espetáculos públicos, outros foram cobertos de alcatrão e queimados vivos, como tochas humanas. Começou assim uma campanha de violência anticristã que, tristemente, foi regressando periodicamente ao longo dos últimos 2000 anos e continua ainda hoje.
O historiador romano Tacitus lamentou a morte dos primeiros mártires, mas não por causa da injustiça e desumanidade:
para acabar com o rumor [de que tinha incendiado Roma], [Nero] acusou falsamente de culpa e puniu com as mais terríveis torturas as pessoas vulgarmente chamadas cristãos, que eram [geralmente] odiadas pelas suas enormidades. Christus, o fundador desse nome, foi morto como criminoso por Pôncio Pilatos, procurador da Judeia, no reinado de Tibério, mas a perniciosa superstição [prava superstitio] – reprimida por um tempo, eclodiu novamente, não apenas na Judeia, onde o mal originou, mas também na cidade de Roma, para onde todas as coisas horríveis e vergonhosas fluem de todos os cantos, como para um recetáculo comum. … uma vasta multidão foi condenada, não tanto sob a acusação de queimar a cidade, mas de “ódio à raça humana”.
E você pensava que era só desde o surgimento do “wokismo” que a Igreja era maltratada por “espalhar o ódio”, ou que o Cristianismo é acusado de ser uma superstição depravada.
Mas o martírio representa um inesperado paradoxo. Os primeiros inimigos da fé, em Jerusalém, acreditavam certamente que ao crucificar Jesus estariam a pôr fim não só a Ele como a tudo o que Ele estava a tentar construir. Mas afinal a sua morte – e ressurreição – tornou-se um estímulo ainda maior para a divulgação do Evangelho. Tácito notou que a perseguição e os mártires evocavam a simpatia popular, o que por sua vez fazia avançar a fé.
É conhecida a expressão de Tertúlio, o teólogo norte-africano do Século III, de que o sangue dos mártires é semente de cristãos. Para muitos dos que sofrem perseguição, a coisa pode não parecer assim, e para os poucos que prestam atenção a estas coisas também não. Mas é verdade.
O maior número de vítimas, actualmente, chega da Nigéria, com cerca de cinco mil cristãos martirizados por muçulmanos a cada ano. Há pouco mais de uma semana um grupo de muçulmanos obrigou 200 cristãos a entrar num edifício e pegou-lhe fogo. Os que não morreram queimados foram emboscados ao tentar fugir.
Porém, a Igreja na Nigéria é a que mais cresce em toda a África.
Tristemente, aconteceu uma coisa parecida na quinta-feira num par de aldeias na Cisjordânia, na Terra Santa, incluindo uma cristã. Um grupo de extremistas judeus, a quem erradamente se costuma chamar “colonos”, atacou Taybeh e Kafir Malik, incendiando casas e matando três árabes.
Não é, de todo, a primeira vez que os cristãos em Israel são assediados. Há um segmento de judeus ultraortodoxos em Israel que tem revelado um preconceito persistente contra cristãos, cuspindo em padres e intimidando pessoas – tipicamente cristãos – que trabalham ao sábado. Sepulturas e lugares santos cristãos foram profanados. Em 2012 pegaram fogo às portas de um mosteiro trapista e picharam as paredes com o insulto: Jesus era um macaco”.
Embora tenha sido claramente obra de judeus extremistas, não deixa de ser surpreendente que isto pudesse acontecer em Israel. O Vaticano tomou a posição pouco comum de fazer uma reclamação formal ao governo de Israel por não controlar tais expressões de ódio. O custódio da Terra Santa à época, o Arcebispo Pierbattista Pizzaballa (agora Patriarca Latino), comentou: “Chegou o tempo de as autoridades tomarem medidas para pôr fim a esta violência sem sentido e assegurar uma ‘educação para o respeito’ nas escolas, para todos os que chamam casa a esta terra”.
Na passada década foram reportados mais de 150 casos semelhantes de ataques anticristãos em Israel.
E há hindus e até budistas a levar a cabo ataques semelhantes contra cristãos nos dias de hoje.

Ainda assim, a maior parte da violência anticristã nos últimos anos tem sido devido ao inevitável choque entre o cristianismo e o islão, como documentei no meu mais recente livro “Os Mártires do Novo Milénio”. No Ocidente acreditamos na liberdade religiosa e no pluralismo, por isso temos alguma dificuldade em dizer que os muçulmanos, ou membros de qualquer religião – que a título individual são geralmente membros pacíficos da sociedade – podem também tornar-se violentos, motivados precisamente pela religião, apesar de não termos qualquer dificuldade em ver essa violência no nosso próprio passado.
Quando os “extremistas” apelam ao estabelecimento de um califado global, estão a falar a sério. E por causa das origens do Islão, essa conversa ressoa até entre aqueles muçulmanos que não estão dispostos a pegar em armas.
Muitos, por amnésia histórica, pensam que as Cruzadas, que no seu tempo se justificavam, são uma grande mancha na nossa história. Entretanto ignoramos a militância do Islão, que espalhou rapidamente pelo Médio Oriente, depois Norte de África e até Sicília e Península Ibérica, não pela evangelização, mas pela conquista, até ser travado por uma força contrária cristã. Quem conhece a história sabe que as vitórias cristãs em Tours, Poitiers, Lepanto e Viena são os marcos de como o Cristianismo foi preservado na Europa.
O actual nervosismo em muitos países europeus que permitiram a entrada a grandes quantidades de imigrantes muçulmanos ilegais é um exemplo actual de um problema semelhante. Apesar de os líderes seculares e religiosos pedirem aos seus compatriotas para ajudarem a integrar estes imigrantes, tornou-se cada vez mais claro que muitos não estão interessados em integrar-se e, nalguns casos, pretendem mesmo substituir as culturas dominantes. Isto não augura nada de bom – para ninguém.
O culto da superioridade do “outro” e o ódio ao passado cristão, tão comuns nos países ocidentais – incluindo na América – sobretudo nos campus universitários e nos media, torna mais difícil enfrentar estes desafios. Os recentes problemas no Médio Oriente forçaram os nossos media a relatar que, de facto, os iranianos e os palestinianos cantam mesmo pela morte a Israel e à América. Este sentimento não tem falta de simpatizantes na Europa e até mesmo nos EUA.
Os cristãos em todo o lado devem estar vigilantes para combater estas correntes, onde quer que possam aparecer. E estão a aparecer cada vez mais. É ingénuo e moralmente errado nada fazer, crendo que somos de alguma forma imunes a esta história violenta e bem documentada.
Robert Royal é editor de The Catholic Thing e presidente do Faith and Reason Institute em Washington D.C. O seu mais recente livro é A Deeper Vision: The Catholic Intellectual Tradition in the Twentieth Century, da Ignatius Press.
(Publicado pela primeira vez na segunda-feira, 30 de Junho de 2025 em The Catholic Thing)
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