
Será que é pecado acompanhar as notícias? Ou ler comentadores que comentam as notícias? Ou ouvir podcasts que comentam os comentadores? Ou ver vídeos no YouTube que analisam os podcasts?
Estamos na Quaresma, altura em que as pessoas tendem a confessar-se mais. E esta Quaresma, como tenho notado já ao longo dos últimos seis ou sete anos, há cada vez mais pessoas a confessar que seguem as notícias.
Claro que não o dizem exactamente assim. Dizem que as notícias os deixam revoltados, mais aptos a guardar ressentimentos, a fazer juízos apressados, a alimentar preconceitos, a cultivar más intenções e a regozijar com os infortúnios dos outros – ao ponto de desejar mal àqueles com quem discordam. Tudo isto é dirigido a pessoas que nunca conheceram pessoalmente, como este ou aquele líder político, ou personalidade famosa.
Aqueles que conhecem melhor a linguagem teológica falam das notícias como uma ocasião de pecado, com a qual têm tido pouco cuidado.
Não me recordo de ouvir isto num confessionário uma década attrás. Se sim, era raro. Agora ouço-o frequentemente. O volume e o ethos das notícias estão claramente a perturbar a paz dos já poucos católicos que se confessam. Os piedosos, dir-se-ia, deveriam ser menos sujeitos aos distúrbios das coisas passageiras. E se calhar até são, mas nesse caso imaginem o estado dos restantes!
O meu colega colunista do The Catholic Thing Francis X. Maier admitiu aqui há poucos dias que já foi viciado em notícias.
Já não? Hoje, muito menos, porque “frequentemente, hoje em dia, vejo-me fechado na minha própria mente, na Terra do Irreal, a combater inimigos e ideias que me impedem de ver a beleza do mundo e das pessoas de quem gosto”.
O Francis nota que há muitas coisas excelentes disponíveis online – como o The Catholic Thing! – mas que “estes formatos informativos também albergam uma quantidade generosa de loucos, mentirosos e promotores do ódio… O resultado é a fadiga, tribalismo e (tantas vezes) o queixume. A cultura do queixume é venenosa e é também autossustentável, como uma colónia de carraças nos lugares recônditos do coração, porque há sempre mais um opressor a expor e a acusar.”
Esta é uma queixa já “aborrecidamente familiar”, admite, mas a familiaridade está a gerar tanto desprezo que é preciso lançar um aviso.
“O ressentimento é viciante”, escreve o antigo viciado em notícias. “Pressupõe a maldade ou a ignorância de quem discorda de nós, é um obstáculo ao discurso razoável, porque não vale a pena perder tempo precioso a ouvir os outros se, por definição, eles são estúpidos ou maus, uma vez que as suas posições chocam com as nossas”.

Estas toxinas estão a percorrer as veias da vida pública, com canais por cabo e redes sociais a depender de um modelo de negócio que depende da cultivação da revolta para criar valor. É um modelo comercialmente lucrativo, politicamente poderoso e culturalmente influente.
“Isto explica porque é que há tanta toxicidade na vida pública da nossa nação”, conclui o Francis Maier, mas é bem pior que isso.
Também a vida espiritual de milhões de almas se tornou tóxica. Podemos vê-lo na degradação da nossa vida pública. A vida interior é mais difícil de ver, mas uma degradação semelhante está num grau já bastante avançado e ameaça a santidade de almas que procuram viver uma vida próximas de Deus.
Alguns reconhecem-no e pedem perdão na confissão, bem como a graça do sacramento para resistir a este vício particularmente poderoso. Bom para eles! Mas para muitos outros a vida interior é continuamente corrompida, sem noção e aparentemente sem remédio. As suas mentes, corações e almas são encharcados todos os dias de toxinas que envenenam a “nossa cultura partilhada”.
Há muitos anos, quando alguém vinha à minha procura para fazer perguntas sobre a Igreja Católica, eu costumava começar com algumas palavras sobre o amor de Deus, a nossa necessidade de salvação e a pessoa de Jesus Cristo. Depois fazia uma introdução sobre o que é a oração, e como rezar. Depois, então, um estudo mais formal sobre as verdades da fé.
Agora, quando um jovem me aborda – e normalmente é homem, porque temos assistido a um aumento significativo de homens nestas condições – começo sempre por discutir os seus hábitos digitais. Falo do “PCP”.
Alerto-os sempre para os perigos da pornografia, conflitos piedosos online e política. Todos estão a par da primeira ameaça, e a vasta maioria ou está, ou esteve, viciado nela. Mas alguns ficam surpreendidos por saber que o envolvimento em disputas litúrgicas ou doutrinais online pode prejudicar a sua relação com Jesus. Quanto à política, quase todos começaram o seu caminho rumo às questões mais profundas seguindo vozes políticas populares, muitos dos quais combativos e desprovidos de caridade. Uma boa proporção destes gostam de ridicularizar os seus rivais, mas há alguns que conduzem estes jovens impressionáveis para caminhos perigosos do racismo e do ódio aos judeus.
Depois de uma vida inteira de discipulado, o Francis Maier reconheceu o perigo e desligou o noticiário, preferindo a adoração eucarística. Os jovens não têm nem a experiência, nem a sabedoria para reconhecer isso sozinhos. Mas eu não costumo ter grande dificuldade em convencê-los da importância de retirar o “PCP” das suas vidas, pois estou a apontar para uma coisa que eles já intuem. Rapidamente aceitam que isto é essencial para permitir à graça de Deus entrar.
Há muitas paróquias – nalguns casos dioceses inteiras – que dão prioridade à confissão durante a Quaresma, oferecendo mais horários aos penitentes. O Papa Francisco também tornou as “24 Horas para o Senhor” uma prioridade quaresmal, e frequentemente vai mesmo para o confessionário, por vezes depois de ele mesmo se ter confessado.
Recentemente a Diocese de Arlington, na Virgínia, assinalou um Dia Diocesano do Desligar – um dia para deixar o telemóvel de lado e desligar o ecrã. Trata-se de uma resposta mais abrangente, mas também motivada pelo “PCP”. Calculo que em Arlington haverá mais gente a desligar-se do que a ir confessar-se. Sim, a graça sacramental é mais forte do que um curto sabático tecnológico, mas pode ser que este seja mais urgente, uma espécie de aragem do campo antes da sementeira.
É pecado ver as notícias? Em si, não. Mas para muita gente acaba por ser uma ocasião próxima para pecar. E sobre essas ocasiões existe um conselho relevante muito mais antigo do que o meu “PCP”.
Se o teu ecrã te leva a pecar, corta-o.
Raymond J. de Souza é um padre canadiano. Para além de ser membro da Cardus, é comentador de assuntos católicos.
(Publicado pela primeira vez no sábado, 29 de Março de 2025 em The Catholic Thing)
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