
O calendário católico contém vários dias designados como “Dia Santo de Obrigação”. A Igreja pede-nos que participemos na missa, nestes dias, para honrar o Terceiro Mandamento. Aqueles que assim fazem, devem cumpri-lo com um sentido de dever. Um sentido de dever, devidamente orientado, é uma coisa boa e santa, mas a salvação não advém unicamente do cumprimento do dever.
O sentido de dever mantém famílias unidas. Os pais, enquanto bons maridos, cumprem devidamente os seus horários, vão trabalhar para poder alimentar a família e pagar a renda. As mães também são zelosas, enquanto boas esposas, no cumprimento das suas tarefas maternais, fazendo da casa uma Igreja doméstica. Um bebé retribui essa solicitude maternal com a sua primeira palavra: mãe.
Por vocação e circunstância, as pessoas solteiras têm frequentemente um sentido de dever altamente focado, dedicando as suas vidas a obras que beneficiam a comunidade local e o mundo inteiro. Os padres preparam e executam zelosamente os horários da paróquia para providenciar missas, confissões e baptismos. O dever motiva os trabalhadores a cumprir os horários dos transportes. O dever edifica e defende as nações. Um sentido de dever é a pedra angular da eficiência, da produtividade e do cumprimento das obrigações.
Cumprimos o nosso dever religioso de respeitar o sábado, frequentando a missa aos domingos e dias santos.
Mas sem amor, o cumprimento da nossa obrigação dominical de ir à missa é estéril. Um padre excessivamente eficiente prejudica a sua vida de oração. (O direito canónico proíbe os padres de celebrar um número excessivo de missas). Arriscamo-nos a reduzir a prática dos fiéis a sessões de impaciência, nomeadamente a prática odiosa e horrível de passar a homilia – eloquente, sem dúvida – a olhar para os relógios. Aqueles que têm um sentido de dever truncado tendem a chegar tarde, ou a sair cedo para evitar o trânsito.
O dever requer amor.
A maioria dos católicos ama a realidade da missa, com a sua enorme variedade de símbolos e de relações humanas. Os gritos das crianças são belos, e enriquecem o realismo sacramental da missa, mas é provável que até Nossa Senhora tenha saído da sinagoga quando o menino Jesus estava a chorar com fome, ou a precisar de mudar a fralda. (Não existe um relato disso no Evangelho de Lucas, mas é pena). Adoramos as conversas no adro depois da missa. Casados e solteiros partilham da consolação de poder adorar a Deus na mesma comunidade paroquial. A missa e o tempo que se lhe segue parece muitas vezes uma comédia acidental santa (e por vezes não tão santa). O amor tudo suporta.
Mas o nosso sentido de dever, fortalecido pelo nosso amor, não nos pode salvar de uma realidade ferida pelos nossos pecados. Enquanto pecadores, temos um sentido subliminal permanente de que somos indignos de amor e incapazes de amar. Há sondagens que demonstram que 99,9% da população mundial é carente de amor. Desconfio que os restantes 0,1% estejam a mentir. Só o amor de Deus pode sarar a realidade da nossa dignidade humana ferida e a memória culposa das nossas traições pecaminosas.
O Apóstolo São João escreve: “Nisto consiste o amor: não em termos nós amado a Deus, mas em ter-nos ele amado, e enviado o seu Filho para expiar os nossos pecados. Caríssimos, se Deus assim nos amou, também nós nos devemos amar uns aos outros.” (1 João 4, 10-12). Vamos à missa para dar graças a Deus pelo seu amor e pela sua infalível oferta de perdão.
Precisamos de provas do seu amor? Contemplem a cruz por cima do altar. “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos.” (João 15,13). Demasiado duro para as sensibilidades cristãs? Então contemplem antes o presépio. “Não temais, eis que vos anuncio uma Boa-Nova que será alegria para todo o povo: hoje vos nasceu na Cidade de Davi um Salvador, que é o Cristo Senhor. Isto vos servirá de sinal: achareis um recém-nascido envolto em faixas e posto numa manjedoura”. (Lucas 2, 10-11).

Um bebé indefeso atrai o amor e a adoração de Maria e de José, dos pastores e dos magos. Deus e homem são reconciliados no menino nascido de uma virgem. O Céu e a terra tocam-se em Belém. A própria palavra Belém prefigura a sua missão salvífica: a “Casa do Pão”, o Pão superabundante da Santa Eucaristia, o Pão da vida eterna – a missa! Jesus e a sua Sagrada Família revelam o seu amor constante e ensinam-nos a amar-nos uns aos outros.
João já devia ser um homem velho quando escreveu as suas cartas e Evangelho, e teve a sua visão apocalíptica na ilha de Patmos. Na qualidade de apóstolo mais novo, era conhecido com o Discípulo Amado. A sua juventude e inocência devem ter despertado uma afeição especial. (Há uma dose de humor na cena do Evangelho em que ele e o seu irmão Tiago pedem a Jesus que mande chover fogo do céu sobre os seus inimigos.)
João permaneceu com Maria no Calvário. Do alto da Cruz, Jesus nomeou-o guardião de Nossa Senhora e elevou Maria à qualidade de Mãe Universal. João passou os seus últimos anos em Éfeso, ou arredores, com a Mãe de Deus, celebrando Missa com ela e tornando presente o amor de Deus na Santa Comunhão.
Conta-se (e soa a verdadeiro) que já idoso, João gostava de dizer: “Meus filhinhos, amem-se uns aos outros”. Os seus discípulos em Cristo perguntavam-lhe porque é que repetia uma frase tão delicada e sentimental, e ele respondia: “Porque foi isso que Ele nos disse”.
A salvação vem do Emanuel: O amor de Deus personificado está connosco. O seu amor enche os nossos muitos deveres de graça. “Tomai meu jugo sobre vós e recebei minha doutrina, porque eu sou manso e humilde de coração e achareis o repouso para as vossas almas. Porque meu jugo é suave e meu peso é leve”. (Mateus 11, 29-30)
Jerry J. Pokorsky é padre na Diocese de Arlington. É pastor da paróquia de Santa Catarina de Sena, em Great Falls, Virgínia.
(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no domingo, 29 de Dezembro de 2024)
© 2025 The Catholic Thing. Direitos reservados. Para os direitos de reprodução contacte: info@frinstitute.org
The Catholic Thing é um fórum de opinião católica inteligente. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. Este artigo aparece publicado em Actualidade Religiosa com o consentimento de The Catholic Thing.