Parafraseando São Paulo, se o Cristianismo não fornecesse uma versão fiável da Verdade, então não teria qualquer interesse para nós, ou melhor, para mim.
Aliás, não teria mais interesse do que qualquer outra “religião comparada”, como o Xintoísmo, Zoroastrianismo, ou o Monstro de Esparguete Voador de Richard Dawkins.
E nesse caso o conselho hipotético de São Paulo seria: “Comamos e bebamos, porque amanhã morremos” (1 Coríntios 15,32). E de facto, a “religião comparada” sempre me deu sede.
Mas uma coisa conduz a outra, segundo o raciocínio que qualquer católico conhece no seu íntimo. Pois São Paulo disse, de forma clara: “Se os mortos não ressuscitam, então Cristo também não ressuscitou”.
Atentos a isto, esperamos que o inverso é que seja verdade; e começamos a acreditar na medida em que descobrimos que É verdade, e que só pode ser verdade para que tudo o resto faça sentido.
Daí que a fé não seja nem razoável nem irrazoável. Está para além do que é simplesmente plausível.
Porque a narrativa implausível de Cristo, que encontramos na Igreja, nos seus Santos e nas Escrituras, é de que Cristo ressuscitou dos mortos, e que Ele foi, é, e será o Nosso Salvador. Ele é o Cristo Rei, à direita de Deus Pai, e um com o Autor do Universo.
A premissa nunca foi modesta, e não foi automaticamente bem recebida pelos sofisticados do mundo antigo. Era, na verdade, o contrário do que qualquer grego ou romano “normal” acreditava – que os mortos assim permanecem, consistentemente. (Se não, que sentido haveria em executá-los?)
Os intelectuais, especialmente, assim pensavam. Esta era a “ciência comprovada” do seu tempo. Não tinham paciência para a rever.
Estranhamente, porém, a boa nova encaixava bem com o que os profetas judeus já sabiam e tinham estado a pregar. E por isso é que o Cristianismo começou por se espalhar entre os judeus mais radicais, e por isso também que os romanos o descartavam como um “problema judeu”.
Para os governantes judeus civilizados, era uma questão de “O que é que foi agora?” Os judeus tendiam a ser uma fonte de surpresas: Desta vez o que é que andam a fazer?
Os judeus foram “escolhidos” de entre os povos antigos para preparar, espiritualmente, a vinda de Cristo, tendo-lhes sido dados os meios e a disposição para compreender quem Ele é.
Isto faz parte da longa composição do Cristianismo histórico, que partiu da estação muito antes de Cristo. As marcas do Messias estão espalhadas pelo Antigo Testamento, e podem ser entendidas como marcas de preparação.
E de facto, recorrendo à religião comparada, vemos prenúncios de Cristo em muitas das religiões mundiais. Neste sentido, a nossa fé cristã toca uma fé de toda a parte, e vemos Cristo já “ao longe”.
E é natural que assim seja se, como São Paulo deixa muito claro, a extraordinária pessoa que é Cristo é o aguardado Messias dos judeus e de todo o cosmos.
Uma parte significativa do esforço evangelizador dirige-se ao que será certamente um encontro com os muitos povos ainda por evangelizar, em comunhão com o divino. Mas aqui estamos já a olhar para à frente. O amor não deve ser apressado.
Embora seja mais fácil entender a história retrospectivamente, a cadeia histórica da Igreja é quase impossivelmente complexa. Felizmente, porém, é possível a um católico, na fé, compreender os principais temas.
A partir do início até ao fim, o Nosso Salvador está encarnado na Igreja Católica, e para melhor compreender o que ela é ou não é, existe a comunhão, agora.
A lógica é esta: Porque é que Deus, no qual encontramos Cristo, não garantiria o acolhimento da sua mensagem ao longo da história do mundo? Quem o poderia impedir? Como é que Ele não teria o poder de corrigir quem O nega?
Esta observação, da posição do Cristo vivo em continuidade histórica, vai para além da doutrina política superficial, tocando na história natural.
Podemos ver esta justificação nas obras de extraordinária complexidade através das quais as inúmeras criaturas mundanas se reúnem e crescem – cada uma delas a partir do nada, como o próprio universo parece ter sido edificado e continua a ser edificado. A ordem terrena é inequivocamente milagrosa.
A mensagem da biologia é de milhões, biliões e muitos, muitos triliões para um, contra a hipótese nominalista de “não haver Deus”. Um único corpo humano é composto por triliões e triliões de células intencionais e animadas, e cada célula é “irredutivelmente complexa”. No entanto, tudo o que faz um ser humano é derivado de uma única célula, que foi criada, ex nihilo, no início.
Este é o ponto de entrada para os factos implausíveis da vida. E, porém, milagrosos como são, não começam sequer a alcançar os mistérios da mente, que não são numeráveis. Porque o nosso “cepticismo” requer sempre uma contagem, mas na nossa consciência “somos” apenas, sem nada a acrescentar.
Laudabitur Dominus, existem lugares inacessíveis à nossa ciência.
Sugerir que o Nosso Salvador permitiu uma narrativa falsa da sua Encarnação, ou até que Ele não consegue conceber um meio para corrigir os agentes errantes da sua Igreja, requer uma fé muito maior do que aquela que a Igreja propõe.
Um padre pode perder o caminho, um Papa pode perder o seu caminho, mas que efeito é que isso tem contra um pano de fundo tão imenso? Que marca discernível é que deixa sobre estes campos infinitos?
A Ressurreição não quebra quaisquer leis. Confirma a lei que vigora desde o início. Mesmo a imperfeição, a falibilidade, da criatura humana foi narrada, desde início, na história de Adão e Eva.
E embora a história ainda não esteja completa nos seus detalhes infinitésimos, já nos conta aquilo que precisamos de saber.
O cristão católico deve usar a sua perspicácia, a sua inteligência, quando confrontado por contradições evidentes. Porque a incompreensão, uma vez ultrapassada, pode levar a maior compreensão.
Há muito que podemos não saber, e que poderemos nunca saber, da natureza sobre o Deus da natureza. Mas no Cristo ressuscitado, temos clareza.
David Warren é o ex-director da revista Idler e é cronista no Ottowa Citizen. Tem uma larga experiência no próximo e extreme oriente. O seu blog pessoal chama-se Essays in Idelness.
(Publicado pela primeira vez na Sexta-feira, 5 de Abril de 2024 em The Catholic Thing)
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